por Cássio Barbosa
Qualquer microrganismo, para sobreviver, tem de transformar alimento disponível em energia. Qualquer que seja esse “alimento”, ele deve ser metabolizado para que se torne uma forma de energia útil e que seja capaz de manter esse microrganismo vivo. Esse processo envolve várias etapas, como captação desse alimento, diversas reações químicas e troca/produção de diversas substâncias. Para isso acontecer no nível celular, é preciso um meio em que seja fácil haver disponibilidade/transporte desses materiais, ou seja, que
eles sejam capazes de transitar com facilidade até os microrganismos e dentro deles. Então já se sabe que o meio em que isso deve ocorrer deve ser um meio líquido. Um sólido ou um gás não poderia fazer isso. Aliás, é por isso que congelamos os alimentos para eles durarem. Dessa maneira, a água é que faria esse leva-e-traz de substâncias facilitando o metabolismo de bactérias - quando se torna sólida, ela as impede de estragar os alimentos.
Esse meio líquido deve agir de três maneiras: primeiro, para metabolizar nutrientes é necessário que compostos orgânicos estejam disponíveis, de preferência fluindo para dentro das células. Em segundo lugar, o líquido deve carregar substâncias para dentro das células, mas também carregar resíduos metabólicos nocivos para fora, senão o microrganismo se envenenaria. Em terceiro lugar, esse meio líquido deve participar ajudando as reações de produção de energia, não pode atrapalhar tais reações.
Por que a água é a melhor substância para executar esses serviços? Em primeiro lugar, porque a água permanece líquida em uma amplitude relativamente grande de temperatura, desde zero até 100 graus (para uma pressão de uma atmosfera; em pressões maiores a água ferve a temperaturas superiores a 100 graus). Por causa disso é possível encontrar água mesmo com variações drásticas de clima.
Em segundo lugar, porque o gelo flutua. Quando a água congela, ela não afunda e fica na superfície, com isso forma-se uma capa protetora que impede que todo o lago, por exemplo, se congele. Se não fosse assim, ao se formar o gelo iria para o fundo e a superfície voltaria a congelar e iria afundar. Esse ciclo iria perdurar até que todo o reservatório congelasse. Com essa capa protetora a temperatura da água ainda se mantém em níveis aceitáveis para a vida.
Em terceiro lugar, a molécula de água possui uma característica interessante. Apesar de eletricamente neutra, sua distribuição de cargas não é homogênea, isto é, as cargas positivas estão concentradas em um ponto e as negativas estão em outro lugar da molécula. Moléculas com essas características são chamadas de moléculas polares, por que possuem dois pólos elétricos. Essa separação de cargas afeta diretamente como a água dissolve outras substâncias e é fundamental para vida na Terra. As membranas celulares são compostas por lipídios e proteínas que não são dissolvidas em água, mas em contrapartida permitem que moléculas de água as atravessem e possam fazer o transporte de nutrientes e de resíduos.
Mas não existem mais substâncias na natureza com essas características? Existem três outras substâncias promissoras, mas que não são tão adequadas: amônia, metano e etano. Logo de cara as três têm a desvantagem de afundar ao congelar. A amônia é líquida entre -78 e -33 graus Celsius (45 graus de amplitude), o metano entre -182 e -164 graus Celsius (18 graus apenas) e o etano entre -183 e -89 graus Celsius (98 graus). Daí vê-se que amônia e metano devem existir em ambientes com pouquíssima variação de temperatura, mas pior que isso, as três substâncias estão em estado líquido somente em temperaturas muito baixas.
Isso dificulta as reações químicas, pois quanto mais quente for o meio, mais rápido será o movimento das moléculas e mais fácil será a reação. Como regra geral, a velocidade das reações químicas dobra a cada aumento de 10 graus Celsius na temperatura. Em temperaturas tão baixas assim, o metabolismo dos microrganismos que vivem em líquidos como esses será muito mais lento. Além disso, as três substâncias, por não terem uma separação de cargas tão forte quanto a água, dissolvem membranas celulares.
Para finalizar, vale lembrar que a água deve ser uma substância muito comum não só no Sistema Solar, mas também no Universo. Isso porque os elementos químicos mais comuns são, pela ordem, hidrogênio, hélio e oxigênio.
Fonte: colunas.g1.com.br/observatoriog1/
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